domingo, agosto 04, 2013

O FIM-DE-SEMANA PERFEITO (21 MAIO 2013)

1- Sexta-feira o andebol, sábado o hóquei, domingo o futebol: três títulos de campeões nacionais conquistados pelo FC Porto ao Benfica, sendo que dois deles foram conquistados este fim-de-emana em confronto directo com os nossos grandes rivais e o terceiro fora no fim-de-semana passado. É difícil imaginar melhor fim-de-semana, melhor sequência em apenas três dias.

Quarta-feira passada, dei por mim, antes e durante todo o jogo contra o Chelsea, a torcer pelo Benfica e a sofrer, no final, pela injustiça do desfecho do jogo e da Liga Europa. Antes, durante e depois, cumulei de mensagens de apoio e solidariedade a alguns dos meus amigos benfiquistas. Exercício inútil, eu sei: grande parte dos portistas acham que isto é uma traição e os benfiquistas acham que é uma hipocrisia tal como acharam de idêntico desejo formulado por Pinto da Costa. Se ficássemos calados, diriam que estávamos roídos de inveja e que nem sequer éramos capazes de querer a vitória de uma equipa portuguesa numa final europeia, pois que o ódio se sobreporia a tudo o resto; mas se dizemos o contrário, é hipocrisia, nunca sinceridade. Paciência, é por isso que nós somos portistas e eles são benfiquistas. Não sabem ganhar nem sabem perder; são incapazes de jamais reconhecer o mérito alheio e não acreditam que os outros sejam capazes de o fazer; em qualquer derrota, não vêem mais do que o resultado de manobras subterrâneas, árbitros corruptos e sistema viciado. Que triste que deve ser viver assim, como um Rui Comes da Silva, um Silvio Gervan, um Bagão Félix! Que triste que deve ser não conseguir ganhar e não ser capaz de perder!

Pois nós, para que registem, ganhámos três títulos de campeões nacionais em três modalidades diferentes e todos eles decididos mesmo no final, em confronto directo com o Benfica, no nosso estádio e no nosso pavilhão. E, sabem que mais? Não houve um caso de arbitragem, um incidente com os adversários ou os seus adeptos, uma manifestação de mau ganhar, de anti-desportivismo! Ora, embrulhem e imitem no futuro, se o conseguirem - o que eu duvido. O Porto é diferente!

No jogo final do futebol, em Paços de Ferreira, o título escreveu-se sem espinhas nem grandes dificuldades. É verdade (vejam como somos capazes de reconhecer!), que o primeiro golo nasce de um penalty cuja falta é fora e não dentro da área: seria livre e não penalty. Mas isso só se percebeu na repetição, porque, na jogada corrida e ao vivo, pareceu claramente dentro da área. Fora ou dentro, porém, são indiscutíveis, quer a falta, quer o cartão vermelho directo, pois James estava isolado, em posição frontal, frente ao guarda-redes. Mesmo sem o golo, o Paços teria sempre ficado a jogar com dez contra onze até à expulsão de Danilo (isto, se contarmos o Varela, tão estimado pela crítica, e que, para mim, não conta). E a verdade é que, quer onze contra onze, quer dez contra onze, quer dez contra dez, o Paços não teve uma só ocasião de golo e apenas teve um remate perigoso em todo o jogo, enquanto o FC Porto teve várias ocasiões de matar o jogo mais cedo. Com o penalty, ganhamos 2-0; sem o penalty, teríamos ganho 1-0.

No resto, não jogámos bem, como há muito não vínhamos jogando. O campeonato, é forçoso reconhecê-lo, caiu-nos do céu, perdido pelo Benfica, muito mais do que conquistado por nós. Em Paços de Ferreira, como seria de prever, o que valeu foi a vontade e a atitude, essa capacidade de não tremer na hora de ganhar imperiosamente, e não o futebol exibido. Como seria de esperar, Vítor Pereira montou a equipa de sempre, preferindo, varelar no ataque do que arriscar: Kelvin teve o seu previsível e justo prémio por ter decidido o campeonato, ficando no banco até aos 80 minutos; Atsu ficou de fora, castigado e afastado por não querer renovar com uma equipa cujo treinador não reconhece o seu talento ele, seguro de que haverá quem o queira e veja nele o que o treinador do FC Porto não viu, e este nem sequer o convocando para ir festejar o título no final. Porém, pese a rodas as outras opiniões contrarias à minha, o que vejo é o seguinte: há muitos interessados em levar Cristian Atsu do FC Porto, mas não conheço ninguém interessado em levar Silvestre Varela. Não sei porque será, mas é assim.

Mas foi fazendo das tripas coração, espremendo os mesmos de sempre até ao limite e, sobretudo, os determinantes (Mangala, Otamendi, Moutinho, Jackson Martínez), que o FC Porto chegou à vitória em Paços e ao título com que já ninguém contava. Valeu o tal espírito de corpo, a tal cultura de vitória, o tal testemunho do balneário, passado de mão em mão, de geração em geração. Começo a acreditar que, na verdade, até com Passos Coelho a treinador o FC Porto conseguia ser campeão!

Pois, ganhámos e parabéns a Vítor Pereira. O seu curriculum interno, no campeonato apenas, é impressionante: dois campeonatos conquistados e apenas uma derrota nestes dois anos e 60 jogos para o campeonato. Não há como a estatística para desfazer impressões e conclusões estabelecidas: dos sete campeonatos ganhos pelo FC Porto nos últimos oito anos (!) nenhuns pareceram tão inesperados e até tão pouco justificados como estes dois de Vítor Pereira — e, todavia, eles aí estão. E, agora, resta à águia lamber as suas penas e talvez - se tiver humildade para tal, o que não é nada certo — meditar nos malefícios que pode causar o excesso de arrogância e presunção.

É possível que, tal como previu o Dr. Mexia, da EDP, o PIB nacional venha a sofrer ainda mais com o campeonato perdido pelo Benfica. Mas, quanto a isso, há um remédio fácil: basta que o Dr. Mexia e a EDP baixem as tarifas abusivas de electricidade que cobram às empresas e às famílias, e a economia poderá levantar a cabeça e o PIB também. Mais difícil do que isso é o Benfica perceber como é que perdeu três títulos nacionais para o FC Porto em apenas três dias.

2- Esta será a primeira terça-feira, em todos estes / anos, que eu olho para a página ao lado e não vejo a coluna de Cruz dos Santos, mas apenas uma cruz no lugar da sua coluna vazia. Nunca tive o prazer de o conhecer pessoalmente, mas, felizmente, tive ocasião de aqui lhe manifestar publicamente a consideração e o respeito que me mereciam as opiniões de alguém que conseguiu, por mérito próprio, tornar-se numa referência nessa traiçoeira terra da crítica da arbitragem. Porque o fez sempre com uma isenção, uma elegância, uma independência de espírito e uma atitude de serena pedagogia que, a meu ver, o tornaram a única autoridade respeitada no assunto. Costuma-se dizer, nestas ocasiões, que ninguém é insubstituível. Mas, naquilo que fez até ao fim e na forma como o fez. Cruz dos Santos é, de facto, insubstituível.

Ainda há quinze dias, escrevi aqui que tinha agendado, para a época morta do defeso, retomar com ele o imprescindível debate sobre a questão dos penalties de mão na bola ou bola na mão, no qual divergimos nestas colunas, há um ano. Agora, não me apetece discutir isso com mais ninguém. Não vejo ninguém mais capaz de me vencer e convencer - e só assim a discussão faz sentido.

Como leitor deste jornal e fidelíssimo leitor seu, como seu admirador à distância, não me conformo com a sua morte. Eu sei que não faz sentido, mas não me conformo. E, se ainda menos sentido faz que um não crente diga isto, gostaria que, lá, onde quer que ele esteja agora, soubesse o quanto a sua ausência, na página aqui ao lado e na vida aqui ao lado, me deixa uma estranha sensação de desamparo.

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